CARNAVAL: QUAIS FANTASIAS NÃO DEVEM SER USADAS NA FOLIA?
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Os acessórios inspirados para a folia estão disponíveis nas Lojas Humana Brasil – Foto: Divulgação
O Carnaval, uma das festas mais esperadas do ano, é conhecido por reunir alegria, música, diversão, looks criativos e diversos ritmos em uma única atmosfera. No entanto, surge uma discussão importante sobre quais fantasias são apropriadas e quais devem ser evitadas quando se trata de outras culturas, identidades e histórias.
Nesse contexto, o Portal A TARDE entrevistou Jade Lobo, indígena do povo Tupinambá de Olivença, pesquisadora e doutoranda em Antropologia Social na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), para trazer à tona reflexões sobre o tema.
Jade explica que usar roupas que representam de forma caricata o ‘outro’ desrespeita essa identidade e é preciso compreender como essas situações podem reverberar na sociedade.
“Durante o Carnaval, a gente observa a escolha frequente de retratar grupos étnicos, raciais ou de gênero historicamente marginalizados, perpetuando estereótipos por meio dessa manifestação caricatural. Na folia, zombar das experiências desses grupos minoritários se torna aceitável”, detalhou.
Ambulantes vendem acessórios e outros itens para fantasias no Carnaval| Foto: Olga Leiria | Ag. A TARDE
Em relação a homens que se transvestem de mulher no Carnaval, Jade usa o exemplo de circunstâncias cotidianas, onde a ideia possivelmente seria alvo de preconceitos mas, na folia, é socialmente aceita.
“Um homem branco heterossexual cisgênero, por exemplo, não apenas rejeitaria a ideia de trocar de identidade, mas também, em muitos casos, poderia ter discursos transfóbicos, homofóbicos e racistas. Já durante o carnaval, ocorre uma aceitação de representar o ‘outro’ de maneira estereotipada”, disse.
Uma das fantasias que Jade destaca como indevida é a prática de ‘blackface’, que consiste na pintura do rosto com tinta preta e, em alguns casos, o uso de peruca black power para o traje de “nega maluca”.
“A fantasia retrata estereótipos que envolvem a animalização da mulher negra, sustentando narrativas de agressividade e hipersexualização. Além disso, imita traços de mulheres negras de forma negativa, minimizando seus padrões estéticos que são dignos de enaltecimento e não de ridicularização”, contou.
Cena em que personagens de uma série praticam o ‘blackface’| Foto: Reprodução | Dear White People
A pesquisadora também enfatiza o uso inadequado de trajes indígenas, como cocares e ornamentos, que muitas vezes são elementos sagrados e representam a identidade dos povos originários.
“Os recentes ataques às benzedeiras e casas de reza indígenas mostram que esses povos enfrentam discriminação e violência simplesmente por expressarem sua identidade cultural e religiosa. Quando esses elementos são usados para fantasias de carnaval, sem consequências, fica evidente o descado com a apropriação cultural. A mensagem clara é que o uso de trajes, ornamentos e estilos associados às culturas negra e indígena é socialmente aceito, desde que seja adotado por indivíduos brancos”, descreveu.
A sexualização de profissões em fantasias de Carnaval também é um ponto de preocupação. Para Jade, esse tipo de traje reduz a importância dessas ocupações e reforçam estereótipos de gênero.
Foliões aproveitam o Carnaval para expressar a criatividade | Foto: Rafaela Araújo | Ag. A TARDE
“Contribui para a perpetuação de estereótipos negativos associados a essas ocupações. Não apenas reforça o estigma em torno das profissões, mas também propaga a concepção desses profissionais como objetos sexuais, tirando sua legitimidade e respeito no ambiente de trabalho”, comentou.
Segundo a pesquisadora, esse tipo de fantasia se torna mais problemático quando aborda profissões que são predominantemente exercidas por mulheres.
“Um exemplo concreto é realizar buscas simples, como “professora” ou “enfermeira” no Google. É notório que a internet frequentemente direciona para conteúdos pornográficos ou sexualizados […] Isso alimenta e fortalece a imagem social sexualizada, expondo essas mulheres a uma vulnerabilidade aumentada no ambiente de trabalho. Ao invés de serem reconhecidas como profissionais competentes, são reduzidas a potenciais alvos sexuais, contribuindo para o aumento alarmante de casos de assédio”, explicou.
OPÇÃO SUSTENTÁVEL
Na busca de criatividade nos trajes carnavalescos, o folião soteropolitano pode optar por fantasias com os acessórios do Projeto Repense Reuse. A iniciativa utiliza do descarte de calças jeans para produzir pochetes, doleiras e buckets, que custam entre R$ 10 e R$ 15.
“A ideia surgiu como uma solução viável com foco no desperdício zero, destinando as peças coletadas, cujo têxtil não apresenta condições para revenda, para a reutilização criativa desenvolvida por um grupo produtivo de costureiras capacitadas em projeto comunitário”, conta Claudia Andrade, gerente de Implementação do projeto Repense Reuse. (Fonte: https://atarde.com.br)
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