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ILHÉUS, CACAU E O CARNAVAL (MONO)CULTURAL

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Pé de cacau no sistema cabruca || Foto Ana Lee


Toda monocultura é nociva! Desequilibra a diversidade da natureza, diminui a fauna e a flora, empobrece o solo e a alimentação humana. A cultura do cacau parece ter sido uma honrosa exceção: a cabruca, sistema de plantação em que o cacaueiro cresce à sombra de árvores nativas, preservou parte da riqueza da nossa Mata Atlântica.
O mesmo não pode ser dito no campo das relações econômicas e sociais: a riqueza do cacau, em seus tempos de fruto de ouro, se concentrou nas mãos de fazendeiros que dilapidaram fora da região grande parte de sua renda, ostentando luxo e riqueza, grilando terra e assassinando pequenos proprietários, enquanto trabalhadores rurais viviam em condições análogas à escravidão.


Pois bem, em um momento em que a cidade celebra parte de sua memória através do remake de uma novela televisiva global, nos deparamos novamente com a monocultura, dessa vez no Carnaval.
O intitulado “Carnaval Cultural de Ilhéus” não pode ser acusado de não ser cultural, o que seria um contrassenso, dado que todas as relações humanas estão no campo da cultura. Ele parece, entretanto, ser quase monotemático: com poucas exceções, as contratações públicas se resumem a paredão, arrocha, pagode e axé.
A maior parte da programação é feita pelas próprias comunidades e os blocos afro foram chamados de última hora, a uma semana da realização do evento, inviabilizando a produção de novas fantasias e o longo processo de ensaios que envolve suas comunidades.
Nada contra os ritmos acima citados! São legítimos e merecem respeito. Mas, parece haver uma simplificação populista do gosto popular: “é disso que o povo gosta, é isso que o turista quer ver”, como se a população da cidade e os nossos visitantes não fossem muitos, diversos, plurais.
O Carnaval de Salvador é a maior festa de rua do mundo porque abraça a diversidade: além de axé, pagode, samba, guitarra baiana, frevo, se pode ouvir reggae, rap, rock, MPB e outros ritmos presentes na rica produção cultural baiana e nacional. E cadê os artistas de Ilhéus, de vários ritmos dançantes, que têm público durante todo o ano e movimentam o cenário local?


A programação do Carnaval monocultural reflete um impasse da política municipal: a total falta de articulação entre cultura e turismo. A Secretaria de Cultura parece ser o primo pobre e se restringe a gerenciar as verbas federais (Aldir Blanc, Paulo Gustavo) e o esquálido fundo de cultura.
A esmagadora maioria dos eventos promovidos pela administração é promovida pela Secretaria de Turismo, e os critérios de contratação dos artistas, a curadoria, a concepção, não dialogam com o Conselho Municipal de Cultura, composto pela sociedade civil organizada.
Ou seja, Carnaval Cultural, Viva Ilhéus, Festival da Primavera, Novembro Negro, os principais eventos realizados com verba pública chegam prontos, são despejados como um pacotão fechado, sem qualquer participação da classe artística da cidade.
Sabemos que a política é um campo de disputas, mas nessa briga de secretarias, quem perde é a cultura e seus protagonistas, impossibilitados de opinar, ajudar a construir, participar do processo.


Nossos dirigentes parecem esquecer que, em nossa tradição local, o cacau floresce na sombra da mata, e que a preservação de outras espécies é fundamental! Adotemos essa sábia lição da natureza na execução das políticas públicas municipais.
Paulo Mesquita Magalhães é jornalista, cientista social e membro dos conselhos municipais de Cultura de Ilhéus e de Itabuna, e do Conselho Gestor da Salvaguarda da Capoeira na Bahia. (Fonte: https://pimenta.blog.br)

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